Dona Clara sorria com lábios de luz, quer o sol se estivesse a levantar ou a pôr, quer o calor do verão lhe aquecesse a alma ou o frio do inverno lhe esfriasse os pés. Dona Clara gostava de se desdobrar em amabilidade para não ganhar vínculos de amargura, era um lago de calmaria onde até os peixes nadavam desapressados.
Tinha tiques encantadores, Dona Clara, que sempre que sorria inclinava levemente a cabeça para o seu lado direito, uma perspectiva diagonal de quem desabafa, ou seria para deixar livre o ombro esquerdo, nunca soube dizer, nunca soube encostar os pensamentos atrelados de céus muito pouco estrelados.
Mas um dia Dona Clara, ouviu falar que havia uma crise no país, ouviu falar de uma crise na europa, ouviu as queixas do vizinho de cima, do do lado, do senhor da padaria, sempre com um sorriso, Dona Clara, já leu o jornal hoje, isto assim não tem remédio, já sabe do meu sobrinho que é médico e recebe 500$, já não há profissões dignas, já sabe do leiteiro ali da esquina, abriu falência a semana passada, e tanto foi o queixume que Dona Clara ouviu que o pescoço se lhe prendeu num torcicolo desalmado e Dona Clara menos calma concluiu que era esse o seu último dia útil do mês.
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