sexta-feira, julho 23, 2010

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Andava descalça pela rua crua, sem sentir o frio que lhe subia pelas pernas acima, sem se dar conta das plantas do caminho misturadas com as plantas dos pés, seiva com sangue, sangue com seiva e a poeira encrustada na estrada, encostada no corpo.

Andava descalça pela rua, mas não era como se fugisse de alguma coisa ou como se voltasse a sítio nenhum. Os passos certos e o destino incerto, andava para não se abandonar e no entanto há tanto que ela já não morava em si.

As pessoas que passaram apressadas fingiram que não a viram, ou talvez não a tenham visto mesmo e ninguém a interpelou nem perguntou para onde ia.

Andava descalça pela rua e foi assim que passou, como se não tivesse de facto passado mas tendo deixado no chão as marcas de um sangue misturado que tornou a rua diferente... por uns dias.

Depois? Depois ninguém sabe que lhe passou, para onde foi ou que fez. Ninguém lhe perguntou, ninguém se perguntou e o mundo continuou igual.

domingo, julho 04, 2010

Momento cultural do dia

Em todas as ruas te encontro
em todas as ruas te perco
conheço tão bem o teu corpo
sonhei tanto a tua figura
que é de olhos fechados que eu ando
a limitar a tua altura
e bebo a água e sorvo o ar
que te atravessou a cintura
tanto tão perto tão realque o meu corpo se transfigura
e toca o seu próprio elemento
num corpo que já não é seu
num rio que desapareceu
onde um braço teu me procura


Em todas as ruas te encontro
em todas as ruas te perco


Mario Cesariny