quarta-feira, dezembro 30, 2009

John Waters said: "Without obsession, life is nothing."



Ando meio obcecada.
Não é verdade, ando totalmente obcecada, como me acontece todas as vezes que não percebo totalmente uma coisa e ela não me sai da cabeça durante dias a fio.

Portanto: ando totalmente obcecada exactamente com isto que a cena do "Happily Ever After" magistralmente mostra - este género de momentos inesperados em que dois caminhos se cruzam sem se tocarem e nasce uma tremenda vontade de agarrar o caminho alheio pelos colarinhos. E sem parecer stalker, o que pode ser tarefa impossível.

Acontece que às vezes há a tal "especie de simpatia" que até pode ser recíproca e ainda assim "a coisa" não arranca. Reparem lá que não estou a falar do pequeno e controverso universo do "amor/paixão/quero-te-comer-e/ou-tomar-conta-de-ti". Até porque esse é mais fácil (especialmente em contexto certo, aka, crazy-disco-night).

Estou mesmo a falar de qualquer coisa mais estranha do que isso, daquela sensação "esta pessoa tem ali qualquer coisa que eu quero saber o quê porque me cheira que a minha vida vai ficar mais cheia depois de saber". E... pumba, toma lá os constragimentos sociais.

Portanto, na verdade ando obcecada com duas coisas: o facto de, de vez em quando, olhar para alguém novo e pensar que quero essa pessoa próxima (e se isso acontece com mais gente); o facto de tentar perceber como é que isso se faz de uma forma polida (ou seja, "não-esquisita") e eficaz.

Porque há quem o consiga fazer com naturalidade. Juro, já vi.


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Na verdade ando obcecada por outras coisas também, nomeadamente pelas re-criações, re-interpretações, abordagens e transformações. E claro, é a meio de uma noitada de trabalho que me dá para estas coisas me explodirem nas mãos.
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O dia em que John Waters perdeu a metade de cima do seu bigode começou como qualquer outro dia, em que John saiu de casa durante a sua manhã que era a tarde de quase toda a sua cidade e começou por endireitar os dois flamingos de plástico que ainda hoje estão no seu jardim. Calculo que ele não se lembre desse gesto, mas que acredite que o fez. Afinal de contas, os gestos tantas vezes repetidos não são lembrados nas vezes específicas em que aconteceram mas sim numa memória mais vaga de quem o sabe mas não o recorda.

Assobiando em tom relaxado, lá foi ele rua fora, em direcção a uma escura e fumarenta sala a que em alguns momentos chamava "escritório" e onde apenas aconteciam "reuniões". Era quase um dom que essa sala tinha, a de fazer acontecer "reuniões", onde às vezes havia troca de fluídos em estranhas cerimónias sexuais.

Nesse dia aborreceu-se rapidamente de estar no "escritório" e foi procurar companhia no conhecido bar mais próximo. Não que John fosse uma pessoa muito necessitada de companhia, preferia algumas vezes o seu silêncio, mas outras a companhia sabia-lhe bem. O bar mais próximo nada tinha de recomendável, mas e daí, John também não tem. E ainda mais, nem chegou a lá entrar. Ainda ia a meio caminho quando os seus olhos foram esbarrar numa estranha personagem de meia-idade, sentada no banco mais típicamente banco, completamente crú, desnudo e sóbrio, com uma tela à frente que acariciava devagar com um fino pincel.

O desenho ainda não tomava forma, mas apreciava-se a firmeza do pincel. A tinta em quantidade impecável deixava um risco tão profundamente riscado que qualquer caneta bic morreria de inveja da sua lealdade.

Não fosse esta firmeza suficiente para espantar, rapidamente John se aperebeu que tal personagem era cega. Não soube como, não precisou de a olhar nos olhos, não precisou de confirmação e ainda assim a cabeça dela levantava-se por cima da tela por momentos, e logo à tela voltava.

John parou e ficou a olhar. A cega não, continuava apenas a pintar.

John acendeu distraídamente um cigarro. Se ele conhecesse Fernando Pessoa teria acendido um distraído cigarro, ou se tivesse tido a minha professora de português, sempre a insistir neste exemplo. Que se lixe, distraído é que não estava John, contrariando a figura de estilo que a minha professora gostava.

Deixou-se ficar a olhar, a pintura a tomar forma. As mãos agéis, o traço seguro, os gestos decididos, os olhos que não viam. Ah, mas aquilo era ver, de uma maneira qualquer, aquilo era ver. "Vou falar com ela" pensou, e deu um passo resoluto em frente, logo antes de parar. "Vou falar com ela sobre o quê?? Sobre o facto dela pintar e não ver? Isto não vai correr bem e a conversa vai ficar por aí...".

Aqui estranhou-se. Pah, ele nem era destas merdas. Habituado ao sub-mundo mais esquisito e a formas de vida altamente reprováveis, conhecido por fazer o que lhe dava na real gana e com pouca grana ainda por cima... Não, mas aqui era diferente. Sempre se esteve a cagar sobre o que diziam dele... não era bem verdade, na verdade dava-lhe um certo gozo o que diziam de mal sobre ele mas... mas.... mas nada! Aqui não era importante o que a cega achava dele, era importante é que ele conseguisse dela a disponibilidade para lhe explicar como é que ela fazia aquilo.

"Ok, preciso de uma abordagem tácita" pensou. E sentiu-se lixado, porque para isto é que ele não tinha jeitinho nenhum. Mordeu o lábio de cima, um tique de concentração, semicerrou os olhos e pôs-se a pensar em soluções.

"Posso isto... não. Posso aquilo... não. Posso o outro.... não. Então e se for lá e perguntar... também não dá..."

Olhou em volta à procura de um lugar para se sentar e sentou-se. No passeio, encostado à parede, e tirou outro cigarro. Dali conseguia ver metade da tela e alguns movimentos da cega. Deixou-se ficar a olhar, a fazer suposições, a planear abordagens e formas de meter conversa. Afinal de contas, ela não haveria de estranhar, era cega e pintava, de certeza que já lhe tinham perguntado as coisas que ele queria perguntar e que não sabia bem quais. Via-se que ela via o que ele não via, e ele queria saber o que era e como é que ela fazia. Mas bolas, que raio de pergunta para se fazer a uma cega, "olha, diz-me lá o que vês que eu não vejo e como o vês que eu não 'tou a ver". E ele a vê-la e a ver que não via nada.

Entretido a olhar e a pensar, deu por ele em outras teias de pensamento mais longíquas mas ainda ali ligadas, quando se apercebeu que ela estava a arrumar as coisas.

"Vai-se embora!" pensou. Estava mais espantado do que outra coisa, afinal de contas não só já não sabia à quanto tempo ali estava, como não se tinha apercebido da hipótese dela se ir embora antes que ele se lembrasse de uma genial deixa. E ficou a vê-la arrumar as coisas devagar, quase mais entretido a observá-la do que a planear formas de comunicar e ela que acabou, pegou na sua vara/bengala de cega e começou a andar.

"Afinal como se diz? vara ou bengala? Nunca conheci um cego antes, sei lá qual a terminologia ou o tanas!..." e já estava irritado. E ela desapareceu numa esquina e ele continuou sentado e irritado e calado.

Quando se pôs a caminho do bar, ia a imaginar as conversas que poderiam ter tido, se tivesse conseguido ser tão interessante na forma de meter conversa que a tivesse feito durar o tempo suficiente. Para saber o que ela via, e como traçava um traço tão delineado, e como é que ela sabia o que via e todos os outros como's e porquê's de todas as perguntas que ele não tinha respostas e que estava agora certo que ela as teria todas na algibeira da sua bata.

No bar, uma desilusão. Ou não se exprimia ou os outros não o entendiam e ninguém parecia achar importante o seu interesse pela cega que lhe cegava a cabeça e a sua impotência fraca para fazer aquilo que sempre fazia naturalmente.

Foi-se embora, em direcção a um barbeiro. "Já que não falo com a cega, reproduzo o traço dela no meu bigode, até a encontrar de novo. Depois já tenho conversa, posso-lhe dizer que o traço do pincel dela é tão fino quanto o meu bigode e ela vai ver, porque é uma cega que vê de outra maneira, e depois podemos falar".

Até hoje tem o bigode. Da cega nunca mais soube nada.


segunda-feira, dezembro 28, 2009

paradoxo de (in)temporal

Nunca a humanidade viveu tanto como agora. Nunca tivemos tanta informação a circular por aí, nunca tivemos tanta facilidade de contacto à velocidade instantânea, duas coisas que nos permitem fazer mais coisas e melhor.

Vivemos mais, fazemos mais, mais rapidamente. Corremos mais para fazer ainda mais, temos mais tempo porque tudo se faz mais depressa e nunca tivemos tão pouco tempo para nada.

É qualquer coisa deste género, um enorme paradoxo de (in)temporal.

segunda-feira, dezembro 21, 2009

quinta-feira, dezembro 17, 2009

Sismo em Lisboa, 1h40

em tempo real, o chão em lisboa acabou de shaking like a polaroid picture...

Segundo o twitter, o sismo foi sentido do porto ao algarve.

Por aqui posso dizer q apanhei um valente susto, porque achei que alguém me tinha entrado em casa e me estava a abanar a cama. Fiquei feliz quando percebi que não, que era só um sismo. :S


Bom, o primeiro sismo da minha vida, que senti. Estranho.



(palmas para a TSF e Sic notícias, as primeiras a dar a notícia...)

quarta-feira, dezembro 16, 2009

quinta-feira, dezembro 10, 2009

1ª lei da atracção: ninguém conhece a ninguém.

2ª lei da atracção: a quantidade de entropia de qualquer relação tende a incrementar com o tempo, até alcançar um valor máximo.

3ª lei da atracção: chegados a ponto de valor máximo, é mais fácil sair e ir procurar exactamente o mesmo em outro lado.

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1ª lei da gestão: ninguém conhece a ninguém - usam-se ferramentas para alavancar a notoriedade. Toda a gente conhece superficialmente toda a gente.

2ª lei da gestão: a quantidade de entropia tende a incrementar com o tempo, até alcançar um valor máximo, altura em que é necessário um reinvestimento de recursos.

3ª lei da gestão: chegados ao ponto de valor máximo, vale mais a pena continuar a reinvestir porque é sempre mais fácil a recuperação com uma quota mental pequena do que o investimento necessário para uma taxa de penetração aceitável (ou pelo menos até se ter essa quota mental pequena).


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"vale a pena pensar nisto"

nop, já não vale não.


quarta-feira, dezembro 09, 2009

Aviso à navegação:

Sim, tenho andado com os nervos à flor da pele. Não, não sei que tipo de flor cresce na minha pele, mas sei que os nervos tão todos lá.

Porquê? Uma questão de contas (não só, mas sobretudo). De contas e matrizes. De contas que não batem certo com as contas dos outros e matrizes que parecem meretrizes arrogantes "tu a mim não me tocas porque não me percebes" dizem-me elas de caras com pó-de-arroz e lábios vermelhos.

Bem, contas são contas, fórmulas são fórmulas, não há nada de transcendente aqui. O facto de eu estar a falhá-las consecutivamente trouxe luz à origem do problema. E só poderia ser um: a máquina de calcular do telemóvel não é de fiar. Obviamente.

Conclusão: galgar o bairro de Alcântara em busca de uma boa máquina de calcular. E lá fui eu, pela manhãzinha, entrar de peito feito em pleno pingo doce, levar mais 3 vezes com a músiquinha versão natal pseudo-felizinha e com dezenas de reformados mal encarados e mal dispostos. Máquinas de calcular? Nem vê-las. Encontrões? Já diz a canção: "encontrões, encontrões aos molhos, por causa dos reformados choram os meus olhos..."

Procurar um pingo-docense. Perguntar por uma máquina de calcular. Levar com um sorrisinho incrédulo. Ouvir a repetição da pergunta. Vê-lo chamar outro pingo-docense e repetir novamente. Denoto um tom sarcásticozinho: "Esta Senhora procura uma máquina de calcular". Responde o outro: "Uma máquina de calcular? Pra quê?" Pra quê, perguntou-me ele. Quer com certeza uma descrição exaustiva da minha vida para saber se me há-de dizer se têm ou não máquinas de calcular. Vida essa afastada de qualquer tecnologia tipo telemóveis, computadores, pda's, etc.

Incomodou-o o silêncio, tentou disfarçar o ar incrédulo, diz que não têm.

Saio, em busca de uma loja do chinês. O que é que o chinês não tem?? Ah, máquinas de calcular, mas só descobri depois. Primeiro tive que entrar numa loja daquelas tipo corredorzinho estreitinho afuniladinho com um grande aglomerado de gente à porta, outro no meio e ainda outro lá mais ao fim. 3 aglomeradinhos de gentinha aos encontroenzinhos para chegar às mesmas coisinhas que não sei o que eram. Geez... o que haverá com estas pessoas que numa loja do chinês, já de si apertada, ainda escolhem pôr-se em grupinhos juntinhos nas mesmas zonas?

Fui e vim, a custo com 3 grandes muros para passar. Quando voltei tive que perguntar à chinesa da loja. Uma aventura. Máquina de calcular. O quê? Máquina de calcular. Desculpe? Máquina para fazer contas. Não percebi. Máquina... com botões e números... Ah.. isto? Não, isso é um pseudo mp3 para música, máquina de calcular, para contas... mais, menos, vezes... Ar parado a olhar para mim. Ok, tiro o telemóvel, abro a aplicação da calculadora, mostro-lha: isto, preciso de uma máquina de calcular. Faz um ar iluminado, ahhhh, de quem percebeu exactamente, quase que lhe vejo um brilho de satisfação nos olhos e desaparece para o fim da loja, passando os obstáculos (aka, pessoas) muito mais agilmente do que eu. Volta sorridente e traz com ela 4 capas de telemóvel de cores diferentes.

Agradeço, digo que queria era cor de rosa com bolinhas amarelas e vou-me embora.

Entro numa loja de "brindes" e afins, antigamente lojas das cem pesetas (para a malta da fronteira), mais tarde lojas dos trezentos, posteriormente loja do euro, agora loja do euro e oitenta.

Mais aglomeradinhos de pessoas. Passo rápido, com mais experiência. Olho para o lado e há uma luz que ilumina uma prateleira recôndita. Duas máquinas de calcular sorriem para mim. Uma é cor de rosa forte, a outra é musical. Estão, claro, ao lado dos guaches e aguarelas. Claro. Não conheço nenhum bom pintor que não tenha antes de começar a pintar feito várias contas com uma máquina de calcular cor de rosa forte ou uma musical.

Tenho um momento de indecisão entre as duas. Encolho os ombros, pego na musical, sigo para a caixa.

Tenho uma Kenko musical por um euro e oitenta. Só espero que aguente duas semanas. Não quero repetir o processo nos próximos tempos.

domingo, dezembro 06, 2009

Finalmente um pouco de tempo para velhos projectos:



Um já está. A ver se ainda me consigo atirar de cabeça aos que faltam.

quarta-feira, dezembro 02, 2009


definho. morro. dezexisto, porque existo dez vezes fora do tempo e do espaço reconhecidamente "normais". Seja lá o que isso tiver sido.

terça-feira, dezembro 01, 2009

"Só", livro de poesia de António Gedeão*, é o título da literatura portuguesa mais curto.

O mesmo senhor tem um poema que se intitula "Assim como falham as palavras". Tem piada, porque quem procura um poema sobre as palavras que falham vai ficar surpreendido com o tamanho do poema.

Um dos poemas de António Gedeão que mais gostei foi o "
Lágrima de preta", lido há muitos muitos anos atrás, vestida com uma saia num banco de colégio.

Outro poema dele que me recordo - do título, não do poema - é o "poema do alegre desespero".

Enfim, pequenos resquícios não sei bem de quê, de um tempo que de tão longíquo quase parece ter sido história lida em vez de existência real.


*Nota - Só é do António Nobre, e não do Gedeão. Obrigado Rita. Agora vou ali tomar suplementos para a memória e já volto.