quarta-feira, maio 02, 2012

querido diário

9:00 - deslarga.
9:05 - deslarga mesmo.
9:10 - se não consegues deslargar, vai fazer outra coisa qualquer.
(como, aprender gramática. discutir que des-largar seria o oposto a largar, tal como des-cuidar é o oposto a cuidar)

11:17 - olha em volta sem suspiros. o mundo é para a frente, não se dá corda aos relógios ao contrário que se estragam as máquinas.

12:29 - sente saudade do tempo que passou. sente o tempo que passou, com saudade. sente o tempo nas mãos, a saudade a passar. o toque que te segurou a mão a perder o calor. desvanecer-se. para que outras coisas se vanescam?

12:30 - à procura de novos conceitos agora. só por piada.

12:34 - conceptualização sem materialização, a lógica não existe no mundo real. um sorriso.

13:12 - vais ter saudades do tempo de agora - hipótese que faz tremer. não vou nada, não é possível. não quero. shhht, cala-te e olha o presente como se fosse passado - é circular, anda lá, assume de vez. todas as vezes seguidas. rocambolesco. oi? rucambulesco. oi? shhht, cala-te.

14:12 - perdes o controlo outra vez. em histeria agora. porque o mundo é para a frente e vais sentir saudades disto mas não queres nem saber, só viver, tudo de uma vez. todas as possibilidades não cumpridas, todos os "eus" que poderias ter sido, tudo o que poderias ter agarrado. e agarras uma cerveja fresca para te fazer abrandar, até parar.

15:22 - qualidade de vida embalada por palavras que ouves mas não escutas.

16:15 - nunca serão possíveis, todas as possibilidades do mundo que não escutas. deslarga de novo. inventa, mistura, recria. para fingir que sim. para fingir esquisito. fala esquisito a fingir que sabes do que falas. desdenha dos arquétipos e das cargas mitológicas, finge que só tu sabes do rio de palavras que corre, atribui valor aos artigos e aos adventos - todos nas mesmas prateleiras. faz pior, encena o dramatismo pseudo cosmopolita a fundar alicerces performativos desenraizadamente grostescos, sempre de forma espontânea.

16:16 - ri-te com todos os dentes que tens na boca, os que são teus e os que são mais teus porque pagaste por eles e os escolheste.
16:17 - dá-te conta que és uma pessoa que escolheu os dentes com que sorri ao mundo. e ri-te disso.

18:25 - apercebe-te que é tarde demais, porque ainda nada está pronto.

19:00 - pára para fugir.

22:00 - quietude fugidia, sem saber o que quer isso dizer.
22:05 - ai.
22:06 - ai ai.
22:08 - decides mudar de vida.
22:09 - fazes os mesmos erros de sempre.
22:10 - decides mudar de vida.
22:11 - fazes os mesmos erros de sempre.
22:12 - atinge-te em cheio - não há regresso possível nem fuga provável.

00:15 - decide re-escrever o futuro e acaba na prisão de todos os dias.

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