é muito mais do que simplesmente ter um um cão. Ter um cão nesta zona lisboeta (e calculo que o fenómeno seja extensível a outras zonas do país) é pertencer a um clã. Ao clã dos donos de cães anónimos.
Tudo bem, eu cá so tenho o meu cão há 5 dias, ainda não estou integrada no clã portanto que legitimidade tenho eu para falar disto? Precisamente, tenho a legitimidade do observador que conhece mas que não pertence. Portanto, antes que as normas e regras sociais deste clã onde me estou inserindo aos poucos me nuble o raciocínio lógico e livre, vou falar dele já.
Note-se, a melhor hora para passear um cão é a noite. Depois de jantar, lá para as dez da noite até às 5 da manhã. Temos sossego de carros, sossego de pessoas sem cão (que são as chatas que mandam vir, tem medo, não gostam que um animal querido as cheire gentilmente) e podemos soltar o nosso bichinho livremente. Portanto, sendo a melhor hora é normal que os cães e os respectivos donos se encontrem em passeatas ao luar. Muito romântico ehm?
Ora bem, quando os dois cães se encontram os donos dizem "boa noite". Duas palavrinhas apenas que correspondem aos dez minutos que os bichos se levam a cheirar. Nisto os humanos são mais praticos se bem que a cortesia humana seja bem mais superficial do que a cortesia canina. Seguindo, "boa noite" para os donos, umas "cheiradas" para os cães, se a coisa correr bem soltam-se os bichos de mútuo acordo. Entre os donos este acordo não é falado, é sub-entendido quando os cães começam aos pulinhos. Soltos os cães, começa a correria dum lado para o outro. Eles saltam, correm, pulam, brincam, vão, voltam, voltam outra vez e por aí adiante. No entretanto os donos podem começar uma conversa. É-lhes permitido. Falam sobretudo dos cães. Quantos anos, como são em casa, rações, maneiras de educar, peripécias... por aí fora. Mas não falam muito à vontade, falam porque tem que ser.
Quando os cães se afastam um bocadinho mais, um dos dois chamam-no. Basta chamar um que eles vêm os dois. O chamamento é feito à vez. Portanto, ambos os donos ficam a saber o nome do outro animal.
Isto corresponde ao primeiro contacto. Da segunda vez, se acaso se voltam a encontrar, os dois donos voltam a dizer "boa noite" e cumprimentam pelo nome o outro cão. A conversa continua sobre os mesmos temas e pouco mais. Portanto, quando os cães são amigos os donos aguentam-se para eles brincarem. Mas são os cães que são amigos, a malta sabe o nome do outro cão e não o nome do respectivo dono.
Quando os cães se dão mal nem sequer se diz "boa noite". Cada um segue seu caminho a pensar que o outro dono é uma besta e pronto.
O meu cão já tem alguns amigos: A Xana (uma boxer), a Pestinha (uma dálmata com pintas castanhas em vez de pretas) e o Gaspar (um pitbull). De todos o que ele gosta mais é da Xana e eu gosto mais respectivamente da dona da Xana. É com quem estou mais à vontade e mais tempo à conversa. A Xana é mais velha que o Nogui e já o ensinou a beber àgua do coisinho aquele onde os humanos bebem àgua. Foi giro.
E pronto. Por agora é tudo deste clã de donos de cães anónimos, anónimos são os donos, não os cães.
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