Por todo o lado sabemos e ouvimos histórias de bravos e corajosos jornalistas cujos trabalhos são feitos em condições adversas, perigosas, arriscadas onde a própria vida se encontra em elevado perigo. Estes são os casos de nobres repórteres que se vêem em ensanguentadas guerras, que combatem com as câmaras terríveis fogos, que encontram o mais atroz dos sofrimentos espelhado nos olhos de inocentes vítimas de desastres naturais ou desastres irracionais.
Pois a imprensa regional também têm os seus perigos, riscos, as suas ameaças. Eu que vo-los diga quando saímos de carro com um sol abrasador e 40 graus. Quando os ovos já deixaram de fritar instantaneamente na calçada para simplesmente passarem ao estado gasoso é quando começa a história que vivi e que aqui vou reproduzir para que toda a gente saiba as ameaças com que todos os dias jornalistas e o próprio mundo, se debatem numa tentativa desesperada de sobrevivência.
O cenário: as termas de XXXX (para bem da minha continuidade física não vou revelar nomes). Um barracão mal-amanhado onde as temperaturas exteriores se sentiam como frescas comparadas com o interior. Mas o pior meus amigos, o pior! Oh meu deus, cada vez que me lembro parece que o sinto de novo, o pior caros leitores, foi o cheiro. Aquele cheiro, oh céus, o cheiro. Ovos podres, putrefactos, um odor a inferno. Enxofre, para ser clara. Pois bem, o cheiro entranha-se, domina, inala-se até se perder metade da consciência, pega-se ao cabelo, às camisas, domina-nos, apodera-se da mente não deixando espaço a mais nada. Mas o pior ainda estava para vir.
O vilão: Reinante e imperador daquele sub-mundo no qual circulava gente de poucas vestes, aspecto de morto-vivos, gente que aclamadamente para esse lugar vai de livre e espontânea vontade e ainda pagando para isso. Bom, naquele antro donde é senhor (ou vice-presidente ou vogal), o vilão sabe que tem agentes químicos que vão cumprindo a sua função de atordoamento. O vilão dá-se por isso ao luxo de ter um aspecto pacato e até pacífico. Vê as suas pobres vítimas (a chefinha e eu) começarem a ceder ao cheiro, nas caras o nojo espelhado, a boca salivante, o pensamento turvo, cada vez mais turvo e o cheiro, oh céus, o cheiro! Esse cheiro potenciado pelo calor, esse cheiro entranhado em todo o lado, aquele cheiro! E o vilão espera enquanto as vítimas controlam o desespero, e o vilão aguarda pacientemente enquanto as vítimas aguentam só um pouco mais, e o vilão não tem pressa quando pressentem que as vítimas vão começar a espernear. O que faz o vilão nesta altura? O vilão é um génio do mal, o vilão fala e fala, atentamente, pausadamente, claramente, devagar, muito devagar. O vilão explica e re-explica, atenciosamente inquire se há perguntas, quer saber se se fez entender.
Corajosas as vítimas vão-se aguentando e ao fundo do túnel (ou melhor, do barracão mal-amanhado) aparece uma luzinha, ténue mas brilhante, sinal de esperança, a salvação está perto. Mas o vilão não se cala, há mais coisas interessantes para dizer, para mostrar, para apontar. Ás vezes desfaz-se em amabilidades para mostrar às vítimas como funciona este ou aquele equipamento. Demora-se e tarda-se no chamado “Duche Hemorroidal”, mostra como funciona uma retrete com um chuveiro lá dentro virado para cima. Mostra mas não demostra. E a saída cada vez mais perto. Caminhamos para lá, pausadamente, ao ritmo cadenciado pelo discurso cuidadosamente cadenciado. Tentamos aguentar as réstias de sanidade mental e física e chegamos finalmente ao quarto donde vinha a luz. Uma fonte. Uma fonte de água límpida e cristalina, uma fonte com janela ao fundo. E o vilão desfaz-se em amabilidades e é rasteiro, oh tão rasteiro e vil, tão manhoso e ardiloso… o vilão estende dois copos cheios do inocente líquido cristalino. Á nossa volta o cheiro putrefacto que nos invade, que já se tornou parte de nós, que se colou a braços e roupa deixando uma sensação pegajosa, colante. O vilão estende dois copos inocentes e fala, fala, fala. O vilão diz: “Ah… meras mortais contempladas com a graça dos deuses, é a vós e só a vós tristes e ingénuas pessoínhas que vou conceder a dádiva de levarem aos vossos pecadores lábios o néctar, o miraculoso néctar de águas sulfurosas sem vestígios de estreptococos, a pureza da verdadeira e miraculosa fonte da vida, mais do que diamantes em estado líquido! Um privilégio que não mereceis, uma ventura que vos concedo uma vez na vida para que espalheis a boa nova!”
E nós, ingénuas e inocentes, nós de mente turvada e pensamento pouco claro, eis que nós subjugadas nos deixamos levar pela promessa do fim do sofrimento. As bocas abrem-se sôfregas, a avidez de dar um golo que nos salve, o desejo veemente e o líquido que primeiro refresca… mas depois… depois percebemos o plano! Ah, não! Somos jornalistas, como o super-homem, como todos os super-heróis dos tempos modernos! O caso do Watergate não é nada comparado com este maléfico plano, do planeta de Kripton jamais virá tamanha ameaça!
O néctar de águas sulfurosas mais não é senão o cheiro em estado líquido, a putrefacção que se nos cola à pele que nos quer tomar o interior. Os nossos órgãos que se queria pútridos, decompostos para que nos tornássemos em cadáveres zombies de cheiro a enxofre, meros peões ao serviço daquele terrível plano.
Duas jornalistas frente a um vice-presidente de umas termas. Água sulfurosa. Vómitos na garganta. Mas ele sabe que tem o poder, ele sabe que paga publicidade. Um esgar de vitória dele quando duas jornalistas engolem com cara de nojo o líquido do mal. Mas não se escapa, no fim sai um “belhac”. Depois a fuga! Ele pergunta se não queremos almoçar mas o golpe acordou-nos para a vida de novo, o golpe não deu os seus frutos quando duas imparáveis e temerosas jornalistas descobrem o segredo escondido, encontram o plano malévolo. A fuga. Conseguimos, por pouco mas conseguimos!
Por favor caro leitor, assim que vir a nova “Frise de águas sulfurosas” ou “Frise de enxofre” ou ainda quem sabe “Frise sem estreptococos”… tenha medo, tenha muito medo!!
(E os meus parabéns se conseguiu chegar até ao fim desta leitura completamente narrativa e cem por cento fiel aos acontecimentos, que devido à importância do assunto teve que ser deste tamanho)
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